sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

EU SOU A LENDA , I AM LEGEND


Eu Sou a Lenda: Ele não está Sozinho!

por Marcelo Carrard
Houve um momento histórico em que a humanidade viveu sob a paranoia de uma guerra atômica que iria dizimar em poucos instantes toda a raça humana. Desde os primeiros testes com armas nucleares e os estudos sobre os efeitos da radiação e das armas químicas e biológicas sobre os seres humanos, muito se elocubrou sobre os efeitos terríveis desses atos. Na literatura e principalmente no cinema muitos foram os filmes que abordaram de diversas maneiras o Mundo Pós-Apocalíptico, onde a humanidade tenta sobreviver após uma hecatombe nuclear, ou uma praga gerada em laboratórios secretos, na maioria das vezes de exércitos e seus cientistas enlouquecidos.
Um desses filmes virou uma referência pop. Baseado no livro de Richard Matheson, surge a fantástica história do Omega Man, da Última Esperança Sobre a Terra: The Last Man on Earth.
Com esse título surge no início da década de 60 uma sombria adaptação da obra dirigida por Ubaldo Ragona e protagonizada por Vincent Price e que no Brasil foi lançada em DVD com o título de Mortos Que Matam. A trama conta a história do único homem da terra não contaminado por uma praga onde os infectados se transfiguraram em uma espécie de zumbis que vagam a procura de sangue durante a noite. O cotidiano desse homem solitário envolto pela escuridão e a amargura é uma rotina pela sobrevivência, sempre buscando se abrigar em casa durante a noite para não ser atacado pelas criaturas, até descobrir uma jovem mulher aparentemente não infectada pela praga dos zumbis.
Existe também uma história semelhante em um episódio da clássica série Além da Imaginação, onde um homem apaixonado pela leitura busca um lugar tranquilo para ler um livro, longe da mulher e dos colegas que sempre o incomodam. O lugar escolhido é o cofre de um banco. Só que enquanto ele está no cofre ocorre uma hecatombe nuclear e todos morrem, menos ele que se torna o único homem sobre a terra. No seriado Os Simpsonsexiste uma sátira dessa história intitulada Omega Homer, onde Homer Simpson acaba se tornando o único sobrevivente de um ataque nuclear sobre Springfield. Em 1971, uma adaptação de Omega Man, dirigida por Boris Sagal, é lançada, protagonizada por Charlton Heston no papel desse solitário homem, chamado Robert Neville, lutando pela sobrevivência em um mundo devastado. Mais de trinta anos depois surge uma refilmagem dessa história intitulada Eu Sou A Lenda aka I Am Legend, dirigida pelo especialista em videoclipes: Francis Lawrence, o mesmo diretor de Constantine, com o popular ator norte-americano Will Smithno papel principal.
Nessa adaptação o que mais me surpreendeu foi o tratamento visual quase realista em muitos momentos, totalmente diferente dos exageros deConstantine. As ruas desertas de Nova Iorque, a Ponte do Brooklyn destruída, aparecem com uma verdade desconcertante. A sequência inicial da surrealista caçada pelas ruas de Manhattan deixa muito claro o estado de coisas vigente naquele mundo devastado. A rotina do único sobrevivente de uma praga gerada em laboratório e que dizimou a humanidade se chama também Robert Neville. Enquanto acompanhamos sua rotina de vagar pelas ruas desertas durante o dia e se trancar em casa ao cair da noite, vemos suas lembranças dos trágicos acontecimentos onde a cidade de Nova Iorque estava sendo evacuada e ele acabou perdendo a mulher e o filho. As cenas da destruição da ponte são muito impactantes, mas o melhor do filme está na atmosfera depressiva e sombria das ruas desertas, da dolorosa solidão do personagem e seu cão. Essa composição do homem com seu cão em um mundo pós-apocalíptico me remeteu diretamente ao clássico Mad Max 2.
Eu Sou A Lenda tem paralelos muito interessantes com Extermínio, de Danny Boyle. As ruas e outras locações desertas aos poucos revelam a existência de criaturas mutantes violentas e irracionais, com expressivas bocas que as tornam ainda mais assustadoras. Ao contrário de Extermínio, em Eu Sou A Lenda os muitos ataques dos mutantes aparecem detalhadamente, sem a câmera tremida ou desfocada. Destaque para o ataque no prédio escuro e o ataque noturno onde as criaturas atacam o carro do protagonista.
A brasileira Alice Braga aparece em cena como Anna, uma sobrevivente não-infectada que ouviu pelo rádio um sinal mandado por Neville oferecendo um local seguro como abrigo, numa outra referência à uma situação similar do roteiro de Extermínio. Ela está acompanhada de seu filho Ethan e insere na trama elementos de melodrama familiar fazendo Neville relembrar de sua antiga vida de pai de família. Embora não fique evidente, os roteiristas fizeram questão de deixar claro que Anna veio de São Paulo, para classificar oficialmente a atriz como latina.














































Como o filme recebeu a classificação PG 13 nos EUA, a violência gráfica é bem menos extrema do que poderia e além disso um dos problemas do filme é o didatismo de querer explicar demais e criar um final mais convencional e redondo. Entre defeitos e qualidades Eu Sou A Lenda consegue proporcionar divertimento de qualidade com algumas sequências realmente muito bem elaboradas. Um ator com condições de interpretar esse personagem tão amargurado com a densidade dramática que ele merece talvez pudesse melhorar e muito o filme, masWill Smith acabou sendo a escolha dos produtores por ser um ator muito popular nos EUA, o que acabou resultando nas bilheterias por lá. O uso de canções de Bob Marley, que particularmente eu odeio, soa deslocado, sem sentido dramático dentro daquele contexto, além das sessões de ginástica do protagonista. Para que se preocupar com ginástica se a humanidade foi dizimada por uma praga criada em laboratório? Existe a figura de uma mutante que é estudada por Neville que testa uma vacina para a tal praga. Infelizmente essas experiências não são muito bem aproveitadas na edição final. Apesar de tudo isso vale a pena conferir, principalmente para os que viram as adaptações anteriores, além da impagável sátira dos Simpsons.

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